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Story Publication logo March 10, 2021

How Oil, Cocaine and Armed Conflict Threaten the Survival of the Awá People

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The Jirijirimo waterfall, on the Yaigojé river, in the Brazilian state of Amazonas.
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The FLARES FROM THE AMAZON project seeks to warn of the increased dangers of deforestation and...

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Território do povo Awá, no sul da Colômbia | Arquivo dos indígenas Awá

Noel Amílcar Chapues Guevara e Julio Ricardo Solarte Ascuntar falam da terra indígena Ishu Awá, muito perto da costa do Pacífico colombiano, no distrito de Cofanía Jardines de Sucumbíos, em Ipiales, Nariño, onde seus avós chegaram há 30 anos, deslocados pela violência resultante do conflito com a guerrilha.

"A entrada de diferentes pessoas e empresas em nosso território atrás de recursos, como ouro, coltan, água, petróleo e madeira, está aumentado", advertem os líderes Awá em vídeo gravado com seus telefones celulares, na esperança de que sua voz seja ouvida, especialmente nestes tempos em que a pandemia os está atingindo e isolando.

Julio conta que os indígenas Awá vêm fugindo de suas terras ancestrais nas florestas da costa do Pacífico do Equador e da Colômbia há anos, como consequência de diferentes formas de violência que remontam aos tempos coloniais e até mesmo ao conflito armado colombiano. Forçados a se mudar de um lugar para outro, os Awá não têm território próprio e seus assentamentos são muitas vezes temporários e pequenos. Este povo binacional habita atualmente uma área de 610 mil hectares na fronteira andino-amazôniana, dos quais 480 mil estão na Colômbia e 116.640 no Equador.

Segundo o Departamento Nacional de Estatística (DANE), os Awá somam 44.516 indivíduos do lado colombiano. Destes, 39 mil estão em Nariño e 5 mil em Putumayo.

Casa elevada dos Awá
Os Awá preservam tradições, como viver em casas elevadas feitas de madeira. Imagem cortesia do arquivo dos indígenas Awá.

Os Awá se consideram "pessoas da selva e das montanhas". Eles vivem da pesca e da caça, cultivam mandioca, banana e milho, trabalham com produção de cestas e preservam sua língua materna, Awapít. No entanto, vêm perdendo seus costumes e seus territórios estão se estreitando. A razão é sempre a mesma: a presença de pessoas de fora, que as deslocam para explorar seus recursos naturais.

Julio comenta que, por mais de uma década, as lutas contra a exploração de petróleo têm marcado o destino dos Awá. Ele lembra que, em 2011, quando estavam no processo de titulação da reserva Ishu Awá, conseguiram impedir a construção de 74 poços de petróleo. A preocupação na época era que os 5,8 mil hectares de seu território fossem cedidos à companhias de petróleo, obrigando-os mais uma vez a viver a dor do abandono de suas terras. Mas em 2014, as explorações da indústria petrolífera ainda estavam em andamento, de acordo com documentos públicos do Ministério do Interior. Hoje, a exploração de hidrocarbonetos continua em áreas próximas.

Desde 2011, eles aprenderam que tinham que estar informados e preparados para lutar com os instrumentos apropriados. "Não apenas através de protesto social, mas na questão legal, na educação, na informação para que conheçam nossos direitos, e agora no meio ambiente", diz o líder.

O mesmo está acontecendo nas comunidades em Putumayo. As empresas petrolíferas estão presentes em áreas próximas de quase todas as reservas das etnias Awá, Nasa, Kofán, Pastos, Ingas e Embera Chamí. O mapa da produção de hidrocarbonetos em nível territorial da Iniciativa de Transparência das Indústrias Extrativas (EITI) da Colômbia, mostra os municípios de Putumayo, no sul do país, com áreas em vermelho, que indicam extração de petróleo.

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Mapa producción de hidrocarburos en Colombia, tomado del sitio oficial Iniciativa para la Transparencia de Industrias Extractivas, EITI. Imagem cortesia de EITI.

Noel acrescenta que o interesse pelo petróleo continua aumentando em sua comunidade, Awá Tatchan, no Vale de Guamuez, e a destruição do ambiente produzido por essas explorações tem causado escassez de alimentos e diminuição da caça. Noel diz que as multinacionais invadem seus espaços, o que em várias ocasiões causou contaminação dos rios e riachos por derramamentos de petróleo, afetando seriamente a fauna e as colheitas.

"O esquilo, as aves que conhecemos como panguana, e até mesmo os peixes, não estão mais disponíveis. A carne do mato, que era naturalmente consumida, quase não é mais vista, então as comunidades começaram a comprar carne de vaca, porco ou frango", diz Noel com preocupação, pois para ele os novos hábitos alimentares fazem com que a cultura indígena se enfraqueça perigosamente.

Há três anos, continua Noel, "na comunidade de Mataje Alto, no Equador, a Grande Família Awá emitiu um mandato contra a mineração e a exploração industrial dos recursos ou dos elementos da natureza, como nós os chamamos. Em 2019, reforçamos o mandato e a exigência de respeito aos direitos humanos e à defesa do território", pois viram que tanto o governo equatoriano quanto o colombiano "têm continuado a aprovar um número crescente de títulos para extração em áreas naturais habitadas por nós".

Plantação de banana
Os povos indígenas preservam a produção de banana e mandioca, alimentos básicos de sua cultura. Imagem cortesia do arquivo dos indígenas Awá.

Mas em tempos de pandemia, suas preocupações cresceram. Agora, eles temem que a necessidade de reativação econômica dificulte a proteção de seus territórios. Os líderes Awá, no vídeo que gravaram em seu território, afirmam que a única maneira de enfrentar os problemas trazidos pelas diferentes explorações dos recursos naturais é através da resistência e do trabalho coletivo. É por isso que continuam a fortalecer suas organizações de base.

Terras Awá usadas por redes de narcotráfico

Nos territórios Awá, na Colômbia, a preocupação vai além da exploração de petróleo. Já há algum tempo, suas terras e estradas se tornaram cenas de tensão e ameaças. Um relatório de alerta da Ouvidoria observou em outubro de 2019 que a tensão "é caracterizada pelo confronto entre grupos armados ilegais que disputam o território pelo controle de cultivos ilícitos. O povo Awá enfrenta uma situação especial de vulnerabilidade."

O que está acontecendo em Nariño e Putumayo é tão grave que as vozes de muitos líderes indígenas e jovens têm sido violentamente silenciadas. O Instituto de Estudos de Desenvolvimento e Paz (Indepaz) informou que 30 indígenas foram mortos nessas duas regiões em 2020, a maioria deles do povo Awá.

A advogada Olga Viviana Merchán García, do cabildo Inkal Awá (Kacsati) do município de Villagarzón, também líder indígena, afirma que "a maioria de nossos territórios, não tendo sua própria economia de produção e estando imersos no capitalismo da extração de recursos, muitos deixaram de plantar seus alimentos, tais como banana, milho, mandioca e inhame, para plantar coca. Então, esta é uma situação que afeta negativamente a todos."

Com as plantações de coca em suas comunidades vêm as políticas estatais de erradicação forçada e fumigação com glifosato. "Está provado que esse produto químico não afeta só as plantações de coca, mas também propaga pelo ambiente e danifica outras plantas. Desde 2015, quando as plantações começaram a ser fumigadas, você planta, por exemplo, mandioca e ela sai contaminada com fungos deixados no solo pelo glifosato", diz Noel.

Os Awá observaram como, durante os meses de quarentena obrigatória entre março e setembro de 2020, as operações de extração de petróleo continuaram a toda velocidade e temem que continuem a um ritmo mais acelerado.

A erradicação forçada não só afetou a segurança alimentar do Awá, mas também levou a confrontos com as forças de segurança. A assinatura do acordo de paz entre as antigas guerrilhas das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARC) e o governo foi uma ilusão para os Awá, que não viram o fim do conflito. "Existem todos os tipos de grupos ilegais. Estamos preocupados com o não cumprimento do acordo de paz."

Mesmo assim, as autoridades locais em Putumayo sustentam que, "após a assinatura do acordo, as condições melhoraram", segundo o prefeito de Villagarzón, José Andrés López Muñoz, que também diz que o território Awá "é afetado por cultivos ilícitos" e que "são os dissidentes das FARC que passam pela área (...) de forma mais esporádica". Outros funcionários do Gabinete do Governador de Putumayo não responderam a múltiplos pedidos de contato.

Território Awá
Povos indígenas Awá na Colômbia e no Equador procuram criar um corredor natural. Imagem cortesia do arquivo dos indígenas Awá.

“Estamos convencidos de que um dia viveremos com mais tranquilidade e não teremos estas ameaças. A mensagem é que não vamos desistir da luta, que vamos continuar a defender a vida, o território e nossa gente, nosso povo", diz Julio com esperança..

A caminho da criação da reserva binacional Awá

Enquanto mostram a magnífica cadeia de montanhas que une a Colômbia e o Equador, Noel e Julio afirmam que uma das maneiras que têm para proteger sua sobrevivência é preservar a floresta. Por isso, eles vêm desenvolvendo vários projetos, como o reflorestamento de 350 hectares e a declaração de uma reserva binacional de um território de aproximadamente 40 e 50 mil hectares de floresta primária.

No processo de reflorestamento, Noel explica que visam plantar madeira e plantas comestíveis, frutíferas e medicinais para recuperar seus próprios alimentos. "O projeto beneficiará oito comunidades na zona de integração fronteiriça. Será um grande passo."

Em relação ao grande projeto de reserva, o objetivo é declarar quatro áreas de conservação para a Grande Família Awá na Colômbia e no Equador. "As organizações Unipa, Camawari, Fecae e Acipap estão planejando criar um corredor binacional de conservação de importância para nosso povo," algo que esperam conseguir com o apoio do Fundo de Parceria para Ecossistemas Críticos (CEPF, na sigla em inglês).

Tal área de reserva ajudará a salvaguardar sua cultura e suas crenças. "Nós dizemos que somos um elemento de vida. Assim, os Awá têm uma forte relação com a terra, com a água, com as árvores, com os animais, com os espíritos, com tudo o que ali vive. O território será monitorado e vigiado pelos indígenas Awá, e a intenção é criar a guarda indígena Awá, para que os guardiões sejam os que apoiam a conservação", conclui Noel.

E assim, de uma terra tradicional onde cultivam banana e mandioca, produtos básicos de subsistência dos povos indígenas, Julio e Noel usam suas vozes para denunciar que, no meio de uma pandemia que ninguém sabe quando vai acabar, os Awá estão presos entre a exploração do petróleo, os cultivos ilícitos de coca e os grupos armados ilegais que disputam o território. Eles sabem que estão sob grave ameaça, mas seguem de pé, lutando.


Esta história faz parte da série Flamas da Amazônia do democraciaAbierta/openDemocracy. Na Colômbia, participou a equipe intercultural da Agenda Propia, com o envolvimento de jornalistas indígenas. A série é patrocinada pelo Rainforest Jounalism Fund do Pulitzer Center. Agradecemos os testemunhos e o material gráfico fornecido por membros das comunidades retratadas nesta história, que permanecem isolados devido a Covid-19.