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Recurso Jornalístico Novembro 5, 2020

Ética e colaboração jornalística na cobertura de conflitos na Amazônia

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Ética e colaboração jornalística na cobertura de conflitos na Amazônia
O Amazon RJF organizou em parceria com a Repórteres Sem Fronteiras (RSF), o Instituto de Humanidades da UFBA uma roda de conversa sobre ética e colaboração jornalística na cobertura de conflitos na Amazônia, em um webinar realizado no dia 27 de outubro. Imagem cortesia de Pulitzer Center.

Em um contexto marcado
por múltiplos conflitos, as equipes de reportagens de outras regiões e países
dependem do apoio de jornalistas e comunicadores locais, que têm maior
familiaridade com o território da
Amazônia, para identificar boas histórias, circularem
com maior segurança e produzirem suas pautas. Essa relação de colaboração entre
repórteres de fora e os fixers (ou local
reporting counterparts
) é determinante, porém muitas vezes invisibilizada,
expondo tensões éticas próprias da profissão.

Na perspectiva de contribuir com o debate sobre o tema, o Amazon Rainforest Journalism Fund (Amazon RJF) organizou em parceria com a Repórteres Sem Fronteiras (RSF), o Instituto de Humanidades da UFBA e com o apoio do Pulitzer Center uma roda de conversa sobre "Ética e colaboração jornalística na cobertura de conflitos na Amazônia", em um webinar realizado no dia 27 de outubro.

Entre os assuntos em
destaque, a vulnerabilidade dos jornalistas locais diante dos riscos de
represália por parte de grupos de poder, questões de preservação e proteção de
fontes ameaçadas de morte, a precarização das relações de trabalho, a ausência
de reconhecimento e a manutenção de olhares e relações coloniais na produção
jornalística.

O moderador Felipe Milanez, jornalista e professor na UFBA, abriu a sessão perguntando sobre os temas mais inspiradoras no panorama do jornalismo contemporâneo no Brasil. E embora hajam ameaças — por vezes físicas e por vezes legais — para os repórteres que estão em campo na Amazônia, os panelistas responderam com perspectivas animadoras.

“O que inspira muito na cobertura da Amazônia é o surgimento de novas mídias independentes, muitas vezes feitas pelas populações locais em áreas e estados amazônicos”, respondeu panelista Sam Cowie, jornalista britânico sediado em São Paulo.

Mariana della Barba, editora do veículo independente Repórter Brasil, tem acompanhado com interesse e um certo otimismo o desenvolvimento de mídias alternativas pelo Brasil. Com o crescimento de mídias alternativas, também existe um aumento de jornalismo intrépido que nomeia as pessoas e empresas responsáveis pela destruição da floresta. “A gente está começando a colocar o dedo na ferida e a mostrar quem são os culpados”, acrescentou della Barba.

O cuidado com as fontes

Cícero Pedrosa Neto, repórter multimídia e colaborador da Agência Amazônia Real de Jornalismo Independente e Investigativo, explicou a posição complicada de fixers e repórteres locais ao se deparar com uma percepção exótica e colonial que existe por parte de muitos estrangeiros sobre a Amazônia. “Há uma ideia de que estar na Amazônia é viver uma grande aventura”, comentou Pedrosa Neto.

Como jornalista,
especialmente como fotojornalista, ele tem uma responsabilidade ética em
relação às fontes das suas reportagens, que muitas vezes são marginalizadas
com um exótico “outro”. “A câmera é uma
máquina de produção de símbolos”, disse Pedrosa Neto. “E o modo como isso vai
repercutir na vida desse ‘outro’ talvez seja uma coisa que a gente tem sempre
de levar em consideração.”

Para Lilo Clareto, fotojornalista que também trabalha como fixer desde 2019, uma parte fundamental do seu trabalho é assegurar confiança entre jornalistas de fora e comunidades locais, garantindo a segurança de todos. Clareto explicou que cultivar respeito entre ele e as fontes indígenas é fundamental para evitar a reprodução de uma dinâmica de colonialismo.

“Eu só fotografo onde eu sou recebido”,
explicou Clareto. “Onde me permitem fazer,
faço. Fora isso, eu não faço. Não faço mesmo. Porque eu acho que tem essa
questão de ética, tem a questão de respeito pela pessoa. Porque a fotografia é
uma coisa invasiva. Tem que ter esse respeito
pela pessoa. Respeito profissional e respeito pessoal.”

Responsabilidade ética na cobertura

Colaboração ética nesta
época de COVID-19 também significa ter cuidados excepcionais de saúde. Della
Barba citou como exemplo o seu próprio veículo, Repórter Brasil, que teve que
adiar ou cancelar reportagens em campo em comunidades indígenas para minimizar
riscos de contaminação de COVID-19.

“Sempre a prioridade tem
que ser quem a gente está entrevistando, as nossas fontes”, afirmou della
Barba. “Ir a uma aldeia indígena agora não é seguro, é muito arriscado, não
vamos fazer isso. Levar o vírus para uma aldeia é a coisa mais impensável.”

O webinar acabou com uma
conversa otimista sobre as possibilidades no futuro do jornalismo na Amazônia. Della
Barba, que admitiu que como mãe se considera uma otimista na geração futura,
lançou um apelo à nova geração de jornalistas. “Eu acho que é um momento
difícil, mas também é um momento empolgante”, disse della Barba. “Eu acredito
demais que os jornalistas mais jovens, na faculdade ou recém-formados, tem
muito mais essa capacidade do que nós. ”

Os panelistas concordaram ao concluir que o desenvolvimento de novas plataformas e novas vozes é promissor, e que a colaboração continuará sendo central no futuro do jornalismo na Amazônia. “Nesta época que a gente está vivendo com caída de recursos, com restrições por causa de pandemia e outras seguranças sanitárias, é fundamental que a gente trabalhe juntos e o futuro é esse”, disse Cowie. “Juntos somos mais fortes.”


O Amazon RJF organizou em parceria com a Repórteres Sem Fronteiras (RSF), o Instituto de Humanidades da UFBA uma roda de conversa sobre ética e colaboração jornalística na cobertura de conflitos na Amazônia, em um webinar realizado no dia 27 de outubro. Imagem cortesia de Pulitzer Center.